07 maio 2010

Coletivo: questão de desconfiança

Tem gente que estuda, tem gente que conversa, tem gente que ouve música, tem gente que observa, tem gente que dorme, tem gente de pé, tem gente sentada.Tem gente que faz tudo isso junto. Ao mesmo tempo, improvisadamente, um ônibus coletivo é lazer, pesquisa, descanso e exercício. Alguém se levanta para dar lugar a outro mais velho. Quem dá, se sente orgulhoso. É exemplo. Quem percebe, aprende uma lição. É escola. Quem recebe, se alegra. É gratidão. Quem discorda, desconfia. Vivência?

Um dia antes da finalmente-sexta-feita, entra logo cedo no coletivo aquele negro baixo com a roupa surrada de sempre...Passa a roleta e saca imediatamente... os cartões na desbotada bolsa transversal. Uns amarelos outros azuis, todos são distribuídos aos passageiros que tentam aproveitar de alguma forma o tempo da viagem. Trazem uma única mensagem:

 Depois de distribuir os cartões a todos os passageiros e se certificar que todos leram a mensagem, ele novamente passa recolhendo-os. Os que estudavam talvez procuraram no bolso alguma moeda. Os que ouviam música poderiam desligar o aparelho. Os que estavam de pé pensaram em olhá-lo nos olhos. Os que dormiam, acordaram. Ou nada disso. Quando conseguia arrecadar algo, o pedinte agradecia com uma voz fanha e embargada, quase incompreensível. “Brigado”. Ao sorrir, dava pra ver que seus dentes não estavam bem cuidados.

Num dos bancos, duas pessoas conversavam:
Pessoa 1: “Não sei o que fazer quando essas pessoas vem me pedir dinheiro... Esse ainda diz que vende doce...”
 Pessoa 2:
“Mesmo assim...Já ajudei, mas a gente não sabe o que elas vão fazer com o dinheiro. Outro dia, um mendigo me pediu se dizendo faminto e revolvi ajudar. Só que, ao invés de dar dinheiro, comprei um lanche para garantir. Você acredita que, quando virei as costas, ele vendeu o lanche?! Deve ser para comprar pinga”
 Pessoa 1:
“É... Nesses casos, a gente bem intencionada acaba deixando de ajudar quem realmente precisa”.
Pessoa 2:
“Eu não dou dinheiro”.

Elas mal percebiam que o rapaz estava de pé, de costas pra elas, ouvindo tudo, quieto. Sua expressão parecia a versão afro-descendente da Monalisa.

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